
Obviamente, justificou-se com todos os argumentos disfarçantes que encontrou, desde simples preguiça até a economia de tempo no banheiro pela manhã. Mas, em verdade, protestava.
Seu protesto vinha do fundo da alma, não era algo claro nem a ele mesmo. Fazia-o como um impulso que aos poucos foi entendendo. Era rebeldia contra o tipo de vida que levava, escravo do relógio, das cobranças da chefia, das pressões da vida corporativa, dos conjuntos “cabelos curtos-ternos cinza-sapatos pretos-gravata”. Era um protesto contra a exigência de criatividade apenas no discurso num mundo que prezava, antes de mais nada, a homogeneidade inclusive de pensamento – e, por tabela, a mediocridade. Mediocridade difícil de apontar entre executivos bem remunerados. Mas percebia que todos pensavam igual, agiam igual, acertavam e erravam igual, contavam piadas iguais...
Tardio esse protesto, como já disse, pois já passara dos 35 há tempos.
Como única vazão, deixar crescer a barba não foi suficiente para sanar essa revolta interior. Dissonante, doente por não conseguir colocar sua imaginação e suposto talento em serviço, foi se tornando sorumbático, calado, esquivo, exatamente como descreve o Indicador de Tipos Myers-Briggs com pessoas assim.
Perguntava-se às vezes qual o motivo disso tudo nessa altura de sua vida. Era difícil localizar

Melancolia, como diria Aristóteles, é um estado de espírito

É mais freqüentemente associada a escritores, pintores, filósofos e intelectuais.
Quem dera...
Para ele, o duro de ser melancólico não era parecer sempre triste, ser considerado esquisito ou sentir o peso da existência em suas costas, mas não ter o talento para tirar algo disso como fez Nietzsche, Fernando Pessoa, Clarice Lispector, Dostoiévski, Machado de Assis, Miguel de Cervantes, Camus, Kafka, Goya, Baudelaire, Dürer... São exemplos de gênios, em que a criatividade surgia a partir da melancolia. Em comum entre os grandes e famosos melancólicos da história da literatura, uma certa insatisfação com a vida.

E o brasileiro, o povo, o país, aprendeu direitinho. Aqui, o melancólico é o chato de galocha, o mala-sem-alça.
Não dá futuro ser melancólico em meio a tanto samba, suor e cerveja.