sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

CONFESSO QUE ESTOU CONFUSO

Pensar nas pessoas que conheço, alguns amigos, alguns conhecidos, alguns parentes próximos, outros distantes me deixa confuso.

São pessoas de bem.

Não cairia no clichê de dizer que são cidadãos exemplares, até porque nunca vi suas declarações de IR, mas são gente comum, que trabalha duro para garantir a sobrevivência e algum conforto para suas famílias.

Alguns são mais seriamente religiosos, outros menos, porém espiritualizados. Aparentemente levam suas vidas dentro dos padrões social e moralmente aceitos como corretos em nosso tempo.

São, também, pessoas inteligentes, bem instruídas, cultas em relação à grande maioria, com boa ou ótima formação, bem informadas e com acesso aos mais variados jornais, revistas, livros, rádio, cinema, teatro, TV e internet.

Todos, sem exceção, acreditam no bem, em Deus, no valor absoluto da vida, tem seus padrões de certo e errado definidos em parte pela religião, em parte pela cultura, hábitos e costumes que passam de geração a geração, com pequenas evoluções caso contrário ainda estaríamos escravizando afrodescendentes e cuspindo catarro nas escarradeiras que antes decoravam as salas de visitas da burguesia paulistana (sério, escarrar durante uma visita era chique!).

Somando tudo isso – e mais alguns fatores que não me lembro de citar no momento – meu cérebro se retorce em angustiantes exercícios mentais para tentar entender o motivo de fecharem os olhos para o que considero importantes questões morais e éticas: os direitos animais e o vegetarianismo.

Que direitos animais? Bem, o direito à vida ou, no mínimo, ao não sofrimento.

Quando mastiga um bife, talvez você pense “...oras, não fui eu quem maltratei nem matei esse ser vivo...”. Esse é o pensamento do tipo Don Corleone, o poderoso chefão: ele não matava, nem degolava, nem fuzilava. Ele mandava e financiava. Quando compra um simples quibe é como se você fosse Don Corleone, pagando à lanchonete, que paga ao fornecedor de carne, que paga ao matadouro, que paga ao criador. Você financia a matança, o sofrimento.

Como podem essas pessoas aparentemente corretas fingirem que não sabem o que se passa nas fazendas de criação e nos matadouros e ainda seguirem em frente cravando os dentes num bife que outrora era um ser vivo?

Como pode uma pessoa que se afirma religiosa e critica o aborto, pois para ela a vida é um valor absoluto, não se importar com a vida que se extinguiu para que ela pudesse saciar sua gula com o que ela chama de “deliciosa picanha”?

Dizer que “a Bíblia permite” é uma afronta à inteligência de qualquer um que já tenha lido ao menos um pedacinho deste livro, pois a Bíblia também permite escravizar pessoas, matar a pedradas, oferecer filhas virgens à turba de invasores, etc., etc.

Dizer que “é costume” também chega a ser idiota discutir, pois os costumes, como citei num parágrafo anterior, evoluem (e as pessoas, ao menos em teoria, evoluem com eles e vice-e-versa).

Se só Deus pode dar e tirar a vida, porque essa regra só serve para algumas vidas e não todas?

Será que, para elas, animais são “coisas”, como uma cadeira ou um abajur, e não “indivíduos”?

Será que é assim que deve ser, termos moral e ética seletivas, optativas, ou seja, adotar como correto somente aquilo que nos interessa e descartar como bobagem aquilo que nos incomoda?

Será que eu estou errado? Será que é bobagem considerar animais como seres que também tem direito à própria vida e liberdade?

Tempos atrás eu havia prometido a mim mesmo que deixaria de atormentar as pessoas com essa questão pois vegetarianos insistentes como eu são comparados àqueles religiosos que teimam em nos levar pra igreja ou, pior, àqueles malas-sem-alça alucinados por um jeito excepcional de ficar rico com Marketing Multi Nível tipo Amway ou aqueles do “Quer emagrecer? Pergunte-me como”. Li também que as pessoas iriam começar a me odiar por fazê-las sentirem-se mal obrigando-as e se confrontarem consigo mesmas.

Então eu tive que fazer uma escolha moral – e escolhas morais nunca são fáceis: me tornar um chato de galocha, indesejável para muita gente ou, como a grande maioria, fechar os olhos para a questão e fingir que nada disso existe, que o sofrimento animal é pura fantasia.

Daí eu lembrei de duas frases:

“O que me preocupa não é o grito dos maus. É o silêncio dos bons” - Martin Luther King

“Tome partido. Neutralidade ajuda o opressor, nunca a vítima. Silêncio encoraja o torturador, nunca o torturado”. - Elie Wiesel

Talvez eu seja apenas um cara problemático, confuso, meio perturbado ou então a soma disso tudo e mais algumas.

Mas é sério: entre tantas outras dúvidas, eu realmente gostaria de entender porque as pessoas fecham tão facilmente os olhos para isso. Talvez até me convença de que o errado sou eu.

2 comentários:

Bruna disse...

Escreve muito bem, parabéns! Acredite, o errado não é você, e sim quem fecha os olhos para a realidade.

Dayane disse...

Tbm tenho pensado mto sobre isso, ser ou não a chata de galochas? Vegê há 15 anos.