O verdadeiro falso declínio da carne

por Laetitia Clavreul


Comer uma costela de boi bastante espessa, regularmente? Este prazer talvez se torne proibido para as gerações futuras, de tanto que a produção e o consumo de carne vêm fazendo a unanimidade contra eles. A tal ponto que um número crescente de pessoas, nos países ocidentais, já decidiu excluí-la de uma vez por todas do seu cardápio.

É extensa a lista dos malefícios gerados pela carne. Entre eles estão os riscos à saúde, uma vez que o seu consumo excessivo favorece as doenças cardiovasculares, a obesidade ou a diabete. Além disso, destaca-se, sobretudo, em nível mundial, o risco de desenvolvimento das epizootias (doenças virais ou infecciosas epidêmicas de origem animal) e o perigo que isso representa para a salvaguarda do planeta. Com efeito, as produções de origem animal - carne, ovos, laticínios - são extremamente poluentes. Os bilhões de toneladas de excreções que delas se originam engendram resíduos nitrogenados nos solos e nos rios. Além disso, a pecuária, por si só, representa 18% das emissões mundiais de gases de efeito-estufa. Ou seja, uma contribuição para o aquecimento climático que é mais elevada do que aquela dos transportes.

POLUIÇÃO: Na escala mundial, a criação é responsável por 65% das emissões de hemióxido de nitrogênio (azoto, essencialmente imputáveis ao esterco), enquanto o gado engendra 37% das emissões de metano.

CONSUMO: É preciso 4 kg de cereais para produzir 1 kg de frango, e 6 kg de grãos para 1 kg de porco. Este último necessita, além disso, de 4.600 litros de água. Esta quantidade aumenta para 13.500 litros para 1 kg de boi, enquanto apenas 1.000 litros de água são necessários para produzir 1 kg de trigo.

Um outro ponto negativo desta produção é constituído pelo seu próprio consumo. Os pastos ocupam 30% das superfícies emersas, enquanto mais de 40% dos cereais que são colhidos servem para alimentar não diretamente os homens, e sim o gado. Uma vez que as áreas disponíveis são insuficientes para atender à demanda, a criação de gado pode provocar o desmatamento de florestas. Além disso, a pecuária é grande consumidora de matéria-prima e de água... Resumindo, a produção animal vem sendo objeto de muitos questionamentos. Tanto mais que a Terra, daqui até 2050, terá 9 bilhões de bocas para alimentar.

Neste contexto, será o caso de se prever o fim da carne para este século, ou pelo menos o seu declínio? Muitos são os fatores que conduzem a acreditar nisso. Contudo, esta projeção é contestada por todos os especialistas em previsões. Ao contrário, o que se deve prever é um crescimento do consumo mundial. Com efeito, em todas as épocas, e em todos os países, o aumento da renda sempre foi acompanhado pela progressão do consumo de carne. E não há razão alguma para que esta tendência seja diferente nos países emergentes, dos quais virá o crescimento da população.

Com isso, entre 2007 e 2016, segundo as perspectivas apresentadas em conjunto pela FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura) e a OCDE (Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Econômicos), a produção mundial de carne deverá aumentar em 9,7% para o boi, em 18,5% para o porco e em 15,3% para o frango. Principalmente na Índia, na China e no Brasil. Daqui até 2050, a produção de carne poderia até mesmo duplicar, passando de 229 milhões de toneladas no início dos anos 2000 para 465 milhões. O mesmo ocorre para a produção de leite. Isso por conta da demografia, é claro, mas também por causa do aumento das necessidades em função da evolução da população (mais jovem, mais urbana, mais numerosa) e da modificação do regime alimentar.

"Nos países do Sul, a dificuldade é fazer com que as pessoas possam se alimentar. Neles, no decorrer dos últimos trinta anos, o consumo de carne diminuiu drasticamente, principalmente na África, e essa carência de proteínas animais faz com que as pessoas estejam em estado de desnutrição", lembra Renaud Lancelot, um encarregado de missão para questões de saúde animal no Centro de Cooperação Internacional no campo da pesquisa agronômica para o Desenvolvimento (Cirad).

Bruno Parmentier, que é o diretor de uma escola de engenharia em agricultura, estima por sua vez que a evolução do consumo de produtos de origem animal depende de três grandes questões, que mostram o vínculo estreito que existe entre o consumo de carne e as práticas culturais. Será que a religião hindu, da mesma forma que a religião católica, vai entrar em declínio, e, neste caso, será que a Índia vai passar a consumir muita carne? Será que os chineses vão começar a tomar leite, caso lhes for oferecido um produto que eles consigam digerir? Será que os ocidentais vão continuar a comer carne de porco, no caso de este animal se tornar uma matriz para os transplantes de órgãos?

Em todo caso, uma nova distribuição geográfica do consumo deverá acabar se implantando. Esta consistirá num duplo movimento de balança. Haverá uma diminuição da dieta em carnes nos países ricos, onde elas são consumidas em excesso, e um aumento nos países pobres, onde existe uma carência. Isso serviria para diminuir em parte a disparidade atual. Enquanto são consumidos no mundo, segundo um estudo que foi publicado pela revista médica britânica "The Lancet" (com data de 13 de setembro), 100 gramas de carne por dia e por pessoa, esta taxa média alcança de 200 a 250 gramas nos países desenvolvidos, e bate num teto situado entre 20 e 25 gramas nos países pobres.

"Se considerarmos que a população global vai aumentar em 40% daqui até 2050; e se não ocorrer nenhuma redução das emissões de gases de efeito-estufa vinculada à pecuária, o consumo de carne deverá diminuir até se estabilizar em 90 gramas por dia e por pessoa para que as emissões geradas por este setor possam se estabilizar", afirmam no artigo da revista "The Lancet" os autores do estudo. Seria preciso, portanto, incentivar desde já os consumidores dos países ricos a se conscientizarem dos estragos que o seu consumo abusivo acarreta. Além disso, seria necessário encontrar meios, em nível mundial, não para produzir menos, e sim para produzir de modos diferentes, com o objetivo de reduzir os efeitos negativos da pecuária sobre o meio-ambiente.

Como fazer, então, para acatar as recomendações da FAO, segundo a qual os custos ambientais por unidade de produção animal deveriam "ser reduzidos pela metade, nem que seja apenas para evitar agravar o nível dos estragos causados"? Será que o jeito seria incluir, conforme sugere o encarregado desta organização para as questões animais, Grégoire Tallard, "o custo ambiental no preço das carnes", conforme o princípio segundo o qual é o poluidor quem deve pagar pela poluição que ele gera? Ou será que se deveria privilegiar o consumo de aves, cuja produção é ecologicamente menos agressiva do que outras? A FAO preconiza também o aprimoramento das práticas de criação. Uma das evoluções mais aguardadas diz respeito ao seqüenciamento dos genomas completos das principais espécies (pesquisas estas que se encontram na sua maioria, em fase de elaboração), que deveria permitir acelerar os processos de seleção e fazer coincidirem, por exemplo, rusticidade (e, portanto, a resistência às doenças) e produtividade.

Além do mais, as pesquisas concentram-se na elaboração de rações alimentícias para o gado, que sejam mais econômicas, ou ainda no controle do sistema digestivo dos ruminantes. Neste sentido, a fermentação entérica dos bovinos (produtora de metano, o qual age numa proporção 23 vezes superior à do CO2 sobre o aquecimento climático) poderia ser mais bem dominada. Por exemplo, por meio da utilização de aditivos alimentícios à base de óleo vegetal. Ou ainda, por meio de uma ração dotada de uma maior concentração de cereais.

"Nós conduzimos um experimento com jovens bezerros, por meio do qual conseguimos fazer com que eles cresçam mais depressa, o que permitiu reduzir as emissões de metano", explica Jacques Agabriel, um zootécnico no INRA (Instituto Nacional da Pesquisa Agronômica) de Clermont-Ferrand. Mas, uma vez que a produção animal é um sistema complexo, aquilo que confere de um lado uma vantagem ecológica provoca de outro um inconveniente econômico (uma maior consumo de cereais).

Daí a necessidade, no contexto da busca de um sistema de criação duradouro, de se orientar rumo a uma abordagem global. No INRA, um grupo de reflexão sobre a importância dos produtos animais na alimentação, que reúne sociólogos, zootécnicos, economistas, nutricionistas e agrônomos, já está trabalhando com esta meta.

Enquanto se falava, dez anos atrás, de uma redução da intensidade dos sistemas de produção, este conceito foi substituído por outro: aquele de uma agricultura ecologicamente intensiva. A questão da carne constitui um excelente exemplo desta busca.



Tradução: Jean-Yves de Neufville